terça-feira, 4 de maio de 2010

As melhores coisas do mundo.


Que "As melhores coisas do mundo" é um bom filme, qualquer um pode atestar. Mas, vê-lo aos dezessete anos de idade, torna-o algo muito maior e além do mérito cinematográfico. É inevitável a identificação com as situações da vida dos jovens entre quinze e dezessete anos, personagens do filme. A realidade com que tais situações são retratadas é o maior acerto do filme, sem dúvidas. Nada de adolescentes brasileiros imbecis e extremamente inseridos na cultura pop atual, nem norte-americanos exagerados que ora retratam jovens como drogados promíscuos precoces ("Aos Treze"), ora como acéfalos em busca de sexo a qualquer custo ("American Pie").
Óbvio que há uma certa dramatização de certos eventos da juventude, bem como um excesso em algumas conclusões do roteiro, mas, no mais, o filme pouco foge daquilo que a maioria dos adolescentes de classe média deste país vivem ou já viverem. Não adianta condenar o filme por cenas que mostrem um garoto tentando adquirir o hábito nefasto de fumar a fim de conquistar uma garota. Nem por retratar a escassez de sentimento e a efemeridade dos relacionamentos amorosos, famigerados "pegas". Éticas ou não, tais atitudes são a realidade da vida de muitos jovens. É, como o protagonista Mano tentou alertar à Mãe, distante da ética mas próximo à vida real.
A mãe, no caso, e os outros adultos do filme, apesar de mal aproveitados, representam outra qualidade do filme. Os professores idealistas, que cativam e conquistam os jovens com um pensamento muito mais condizente com a mentalidade destes do que com a burocracia da vida "adulta". Quem nunca se apaixonou pela aula daquele professor que te fazia, mesmo de forma utopica, quebrar paradigmas que, mais tarde, você iria admitir serem inquebráveis? Nesse aspecto, os coadjuvantes já conhecidos do público se saem muito bem: Denise Fraga (a mãe), Caio Blat (o determinado professor de física) e Paulo Vilhena (o romântico professor de violão). As situações da vida escolar também são muito próximas do cotidiano vivido por muitos alunos de escolas particulares pelo Brasil afora. Cenas pequenas mas significativas, como a da disputa pela viagem de formatura, a fim de tranferi-la da "pobreza" de Porto Seguro para o "glamour" de Cancun, despertam risos de quem já ouviu recentemente coisas semelhantes.
Mas, apesar do nome sugerir, o filme não retrata só as maravilhas da vida adolescente. E isso conquista e gera, agora uma triste e nostálgica, identificação do público. Ao longo da adolescência é, infelizmente, inevitável, abandonar suspostas melhores amizades, uma vez estas tendo suas verdadeiras intenções reveladas, e o filme retrata bem isto. A depressão e frustação juvenis também estão presentes. Seja de forma mais leve e bem humorada, como no caso de Mano, frustrado com a ainda existente virgindade ou com a primeira desilução amorosa, seja na forma pesada e quase caótica do irmão mais velho, Pedro, absurdamente abalado com o término do namoro. Mais uma vez, pode ser errado, mas não é incomun, muito menos inexistente, vermos jovens se afundarem em mágoas e recorrerem a remédios, ou drogas ilícitas, como válvula de escape.
Em nenhum momento o filme condena, apenas retrata, certos hábitos. Está tudo lá: a maconha que, deixando as hipocrisias de lado, sabemos ser consumida por muitos nessa faixa etária; o álcool e o tabaco inciados ainda na menoridade; o sexo casual e despreocupado dos jovens; as atitudes pervertidas e ditas imorais de muitas garotas; o amor inconsequente da aluna sonhadora pelo professor... O filme se mostra um fiel e coerente retrato desta atual geração. Da qual, quem faz parte, com certeza sairá do cinema com uma enorme sensação de familiriadade e até de arrependimento. Arrependimento pois o filme deixa (ou pelo menos me passou a impressão de deixar) claro que atitudes como homofobia e bullying devem ser abandonadas. Mas quem não se recorda de, no auge da imaturidade, ter irracionalmente recorrido a tais horrendos artifícios? É apenas neste momento que a obra faz um, diga-se de passagem, ótimo papel concientizador. É inevitável não mudar a opinião à respeito do pai gay e de seu parceiro ao longo do filme, assim como, felizmente, os próprios filhos protagonistas o fizeram.
Agora, deixando um pouco de lado as emoções surgidas após a exibição, destaque para o filme em si: atores competentes, tanto os já citados aultos quanto os grandes achados jovens, principalmente Francisco Miguez, intérprete de Mano. Até mesmo o sempre insuportável Fiuk deixou de lado a chatice do seu personagem de "Malhação" por um personagem mais sério e denso. Trilha sonora cativante, sobretudo a eterna e belíssima canção "Something" dos Beatles, a qual atrevo-me, como beatlemaníaco além de cinéfilo, a julgar a mais bela música do quarteto. Enfim, apesar de admitir ter tido meu senso crítico extremamente afetado pela identificação afetiva com a película, afirmo ser este um ótimo filme. Até porque, merece muito crédito a obra que cative até aos mais céticos. Emocionar não é uma das grandes funções das artes? E quando isto é feito de forma competente então, não há mais nada a fazer senão tirar o chapéu à obra em questão.